Extraído do endereço: http://blogdocharlie.wordpress.com/
Comentário no final.
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Quantos policiais são necessários para trocar uma lâmpada na delegacia?
O Delegado passa e vislumbra a lâmpada do corredor apagada, assim indaga o Chefe dos Escrivães sobre os fatos, esse, alega não saber o ocorrido, então chama o Chefe dos Investigadores, que também alega não ser sua competência tal mister.
O Delegado então expede ordem de serviço para os investigadores procederem às investigações quanto o porquê da lâmpada estar apagada, Após inúmeras diligências apresentam o relatório que a lâmpada está queimada, assim, não é possível realmente saber o motivo, pois, não são experts no assunto.
Diante disso, o Delegado instaura procedimento apuratório repassando ao Escrivão a autuação e registro, constando na Portaria a necessidade de solicitar perícia local para que o Perito Criminal realize perícia, bem como a inquirição dos funcionários para investigar se alguém sabia do ocorrido. Após todos serem ouvidos, nada foi constatado de irregular alusivo àquele fato. Acionado o Perito juntamente com a sua equipe comparecem no local e o Perito constata que a lâmpada está "queimada", porém, alega que tal perícia deverá ser feita pelo setor técnico específico do Instituto de Criminalística, tendo então o Escrivão novamente que expedir requisição ao setor competente. Logo comparece o Perito do setor específico e após periciamento, expede o laudo técnico relatando que o filamento de tungstênio está rompido, não havendo circulação de corrente elétrica, logo não há emissão de luz e calor. O Escrivão juntou o laudo ao procedimento e fez concluso ao Delegado que diante do noticiado exara nova ordem de serviço aos Investigadores com o fito de pesquisar preços de lâmpadas para adquirir. Após exaustivas diligências os Investigadores ofertam relatório com os devidos preços. O Delegado determina ao Escrivão que solicite junto ao Departamento verba para comprar tal lâmpada. Todavia o Departamento alega que não irá encaminhar a verba, pois há uma lâmpada no estoque para que seja encaminhada à Delegacia, mediante ofício. O Escrivão lavra o ofício em 3 vias e após rubrida do Delegado os Agentes vão até ao Departamento para retirar a lâmpada. Voltam para a Delegacia sob alegação de que o ofício não estava endereçado ao setor competente, sendo refeito pelo Escrivão, após perceber a "cara feia" dos Agentes e esses retornam ao Departamento. Logo depois logram êxito em trazer a lâmpada para a Delegacia.
Nova inquirição é realizada aos funcionários para se saber quem teria conhecimento ou obrigação de trocar a lâmpada "queimada" pela nova lâmpada. Tal missão acabou recaindo para o Chefe dos Escrivães que sob a supervisão do Delegado foi trocar a lâmpada, momento em que o Chege dos Investigadores acionou o interruptor um "flash" de luz iluminou o corredor, em milésimos de segundos, voltando a ficar escuro novamente. O pânico toma conta da Delegacia e o Delegado determina ao Agente de Telecomunicações que acione a perícia local o mais rápido possível.
O Perito novamente comparece na Delegacia e novamente alega não ser de sua competência e sim do setor técnico especializado. Novamente o Agente de Telecomunicações expede mensagem e novamente o Perito responsável atraca no local e após profunda análise informa que a lâmpada instalada ali é para circuitos de tensão 110V, porém ali funciona um circuito elétrico de 220V.
O Delegado determina que de novo se entre em contato com o Departamento para solicitar outra lâmpada. Contudo o Delegado do Departamento indaga e estranha o novo e repetido pedido, tendo o Delegado da Delegacia informado os fatos. Assim o Delegado do Departamento ciente do ocorrido não pestanejou e informou a Corregedoria dos fatos. A Corregedoria instaurou Apuração Preliminar para investigar se houve desmazelo por parte dos funcionários com o material público, solicitando cópia integral dos autos e intimando todos os policiais. O Chefe dos Escrivães alegou não ter conhecimento técnico para tal labuta, sendo determinado pelo Delegado, apenas cumpriu ordem. A Autoridade presidente da Apuração entendeu que não houve dolo na ação do Escrivão e arquivou a Apuração.
Após isso o Delegado expediu novamente Ordem de Serviço para os Investigadores pesquisarem lâmpadas de 220V e novamente após árduas diligências restou o relatório com os devidos preços. Então o Delegado determinou ao Escrivão que solicitasse ao Departamento verba para comprar a tal lâmpada. Foi respondido pelo Departamento que devido ao baixo valor não seria possível disponibilizar a verba, pois o trâmite é burocrático e iria se gastar mais em papel do que a própria verba e que era para o Delegado aguardar que eles iriam realizar uma licitação para várias Delegacias com o objetivo de haver economia processual e assim mandar a lâmpada para a Delegacia. Passaram-se uns dias e após tudo isso a lâmpada foi encaminhada a Delegacia, porém o Escrivão asseverou que não iria trocar a lâmpada, pois quase foi repreendido na Corregedoria e não queria atrasar sua promoção que espera há mais de 10 anos. O Delegado determinou aos Investigadores que descobrissem como que é realizada tal troca para que eles assim o fizessem, mas desta vez restou infrutífera a diligência. Diante da negativa de todos os funcionários um Carcereiro que ali estava disse que havia um detido que está no (regime) semi-aberto e ele é eletricista e poderia utilizar tal serviço como pena alternativa da sua prisão. O Delegado não teve dúvida, oficiou ao Juiz do Fórum respectivo da condenação do preso e informou-o dos fatos, representando para que fosse autorizado tal préstimo do detento. Após análise do Ministério Público o Juiz aceitou tal pedido e autorizou que o detento praticasse a boa ação. Assim, em menos de 2 anos a lâmpada foi trocada, iluminando aquele corredor por 10 dias, até a chuva que infiltrou no teto e pingou na lâmpada, queimando-a novamente.
Comentário:
Embora tenha sua parcela de hilário, o texto é cruel ao detectar falhas gritantes na dinâmica da gestão pública. Fundamentando-se em motivos até razoáveis, como o registro de todas as ações públicas, cumprimento da legalidade administrativa e economia dos processos e produtos, fica a mensagem da clara "miopia" dos envolvidos. Ninguém parece perceber a limitação que o próprio sistema impõe. Ninguém faz nada com receio de errar. Parece não existir o vislumbre do objetivo. Parecem não traçar uma meta. A prática comum é cumprir o cotidiano meticulosa e escrupulosamente dentro de uma legalidade e responsabilidade conveniente: a que não me imponha grandes ônus (físicos e ou legais). Com isso esmagamos a criatividade e a ousadia de tentar o diferente para atingir o verdadeiro objetivo do serviço público: servir!
A burocracia, necessária, por vezes, sufoca. |
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