terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Ferramentas periciais - Teresina/PI - segunda parte


Dando continuidade à exposição "Ferramentas periciais aplicadas ao local do crime e ao corpo de delito - o corpo fala", adentramos especificamente no ferramental físico da perícia criminal.


O famoso personagem da literatura inglesa já utilizava sua consagrada ferramenta: a lupa. Como dissemos, o vestígio, sinal físico que vincula objetos numa cena de crime, precisa ser percebido pelos sentidos do investigador, estejam eles desaparelhados ou aparelhados. Evidentemente os resultados com os sentidos aparelhados são bem mais frutíferos.


Tanto na literatura especializada quanto no imaginário cinematográfico diversos equipamentos já nos foram apresentados de forma realística ou fantasiosa. No entanto, foi em setembro de 2010 que o governo brasileiro, pelo Ministério da Justiça, enfatizou um padrão para a investigação material. A Secretaria Nacional de Segurança Pública - SENASP, configurou e doou maletas com equipamentos que foram considerados como básicos para exames em locais de crime.

Apresentação da maleta da Secretaria Nacional
de Segurança Pública - SENASP em Brasília.

Em Alagoas as maletas chegaram em outubro do mesmo ano (veja mais aqui) e os peritos tiveram treinamento três meses depois (veja mais aqui e aqui).

Distribuição dos itens da maleta.

O conteúdo da maleta foi uma aquisição do Ministério da Justiça para ser distribuído entre os governos dos estados, por isso, objeto de licitação. A empresa prestadora dos itens mantém outros produtos à venda e tem, inclusive, a lista completa dos itens da maleta (veja em Conecta190).

Entre os principais itens estão a câmera fotográfica digital, a trena eletrônica à laser, um aparelho GPS (Global Position Systen) e o conjunto de lanternas forenses. Há ainda um conjunto de pós reveladores de impressões digitais e um computador com um programa específico de identificação.

Vale lembrar que estes itens fazem parte de um instrumental portátil para uma equipe de perícia criminal que se desloca para locais de crime. Existem outros equipamentos mais vultosos e poderosos que exigem instalações de laboratório ou meios de transporte adequados.

Máquina fotográfica digital - o registro fotográfico.

Em um passado não muito distante, os registros fotográficos ainda eram resolvidos com o uso das máquinas analógicas e ou providas de filme fotográfico. Com o advento da tecnologia e as enormes vantagens do registro eletrônico de imagens (ainda que se fale sobre a relativa facilidade de manipulação) as máquinas digitais superaram muitas dificuldades como o tempo de acesso às imagens e a limitação de exposições.

Mas não basta "apontar e disparar". É preciso um registro metódico do que é essencial numa investigação pericial e policial. A polícia exige certas vistas da cena e a perícia exige outras.

Num regramento muito simples, três tomadas básicas são exigidas para se enriquecer minimamente um relatório. Inicialmente tiram-se fotos "panorâmicas" que ilustram os arredores e todo o conjunto da cena com todos ou a maioria dos elementos relevantes. Num segundo tempo ou concomitante, faz-se uma aproximação da cena e passa-se a tirar fotos aproximadas ou "de relação" onde conjuntos parciais dos elementos relevantes são agrupados numa mesma foto. Relacionam-se itens por sua vinculação fática ou lógica. É a narrativa "fotográfica" dos exames periciais, que podem até corresponder com a conclusão dos exames. A última tomada é a "de detalhes" ou "close". É a vista ampliada a ponto de se perceber apenas o detalhe. Na maioria das vezes não se sabe onde está este detalhe, por isso a importância da sequência. Primeiro vista geral, aproxima-se e percebe-se onde está determinado vestígio e, por fim, uma vista detalhada que mostra integralmente o vestígio que se buscava e que, na maioria das vezes, só é reconhecido a poucos centímetros de distância.

Esquema didático da sequência de tomadas fotográficas.

Vista a cena, é necessário localizá-la dentro do espaço urbano ou rural. O aparelho GPS é a ferramenta por excelência para este fim. Ele funciona como um mapa dinâmico. Pode mostrar sua localização em tempo real e assim, até guiar a equipe até o local. Uma vez no local dos exames, registram-se as coordenadas e se pode arquivar os "pontos" onde foram feitos exames e que, em geral, correspondem a locais de ações delituosas. Posteriormente pode ser gerado um "mapa do crime" e auxiliar o governo na identificação e gestão da criminalidade.

Aparelho GPS incluso
na maleta da SENASP.

O GPS ainda pode registrar o próprio itinerário e assim construir e confrontar trajetos possíveis ou alegados por suspeitos e vítimas durante reproduções simuladas, p. ex.

Visto e situado o local, é necessário partir para medidas mais próximas dos elementos materiais decorrentes da ação delituosa. Localizar o cadáver, as vias de acesso, os móveis ou equipamentos urbanos nos logradouros é tarefa da medição em local de crime e isso pode ser feito facilmente com a trena eletrônica à laser (figura abaixo).

Trena eletrônica à laser.

Normalmente se imagina a medida de um local com réguas e trenas de fitas. De fato era assim que fazíamos e ainda se faz em muitos lugares no Brasil. A trena eletrônica permite que só um operador faça todas as medidas de modo muito simples e rápido.


Basta encostar o aparelho numa superfície e apontar o laser para a outra que se deseja medir, conforme as figuras acima. A medida sai imediatamente no visor. É o típico "apontar e disparar".

Obviamente toda ferramenta tem suas vantagens e desvantagens. Em locais de pouca reflexibilidade ou iluminação natural intensa a dificuldade do aparelho para medir aumenta. É preciso insistir ou buscar superfícies reflexivas adequadas. O alcance do equipamento também precisa ser respeitado.

Uma evolução da trena à laser é o scaner tridimensional de local de crime. O aparelho funciona como uma trena à laser mas gira sobre seu próprio eixo em todas as direções fazendo muitas medições a ponto de gerar uma "nuvem" de pontos que representará toda a cena.

Equipamento de escaneamento tridimensional de locais de crime.

Uma explicação interessante e sucinta encontrei no vídeo abaixo. Ele fala por si e por isso recomendo que assistam.

Vídeo sobre alguns equipamentos utilizados pela Segurança Pública


As lanternas de luzes forenses foram uma introdução bastante interessante da Senasp. De uma forma barata foi possível fazer com que uma boa quantidade de peritos tenham contato com essa tecnologia.

Em Alagoas fizemos experiências e tivemos treinamentos que podem ser acompanhados por estes links: Oficina de luz forense - preparação e Oficina de luz forense - apresentação.

Recentemente recebemos o equipamento Superlite 400 que não deixa de ser uma lanterna, mas com uma configuração diferenciada com relação à autonomia da bateria e potência da lâmpada. Também neste blog já fizemos referência ao equipamento Superlite 400.

Outros insumos da maleta incluem reagentes químicos para detecção genérica de sangue e específico para sangue humano. Também existem reagentes químicos e pós para revelação de impressões papiloscópicas latentes.

Com relação à revelação de impressões papilares com uso de pós, publiquei algumas experiências durante um trabalho de um colega perito criminal. Veja em Levantamento papiloscópico - pó branco e fosforescente. Também tive a oportunidade de usar a estratégia de luzes rasantes para obter contraste em impressões digitais. Veja em Levantamento papiloscópico "fotográfico".

CONCLUSÃO

O ferramental em perícias criminais não pode se resumir à proposta da maleta da Senasp. A maleta foi um valioso impulso e promotor de um padrão que vale a pena expor e discutir. Um dos maiores desafios da perícia brasileira não é utilizar a última tecnologia em seus trabalhos, mas nivelar, por cima, o trabalho de cada perícia dos estados. Precisamos estabelecer uma confiabilidade nacional e o Ministério da Justiça proporcionou uma parte deste objetivo.

Assim que possível, publicarei comentários e notícias sobre outras ferramentas que são e podem ser utilizadas na perícia criminal. Também discutirei a metodologia, outro desafio da perícia brasileira.

Um pouco de humor!

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